o que que consideram desenvolvimento de historia em jogos?
Na generalidade? extremamente fraca, gratuita, a tentar acertar em "hit points" fáceis previamente delimitados e muitas vezes em cair nos twists desnecessários, redundantes ou mal feitos.
E o que torna a história de um jogo boa? profundidade, ou consequencias das acções tomadas e conteudo à frente de frases feitas. Porque tudo na vida tem consequencias, os videojogos não têm essa obrigação sim, daí muitas vezes servirem de refugio, mas como podemos considerar um produto que as omite como tendo uma boa história? mais para os lados de uma boa utopia.
Claro que depois temos os jogos de paródia aos clichés que ao se assumirem numa postura critica a isso tudo, ou a mandarem isso ás couves à partida, se tornam imunes a esse critério (embora normalmente caiam precisamente nele, de não haverem consequencias), mas refiro-me à plot de jogos sérios, que supostamente estão sempre a tentar ser sérios, daí a probabilidade de falharem, e daí a gravidade de falharem.
Falharem em inovar, falharem em terem profundidade, falharem em terem consequencias, falharem em fazer com que nós nos importemos minimamente... Vai tudo dar ao mesmo.
Jogos geralmente parecem tentar desenvolver a historia através de cutscenes e dialogo, mas não será possivel de outras formas?
(...)
que formas de apresentar "plot" é que existe? obviamente além das bem conhecidas cutscenes.
E como é que preferem a historia de um jogo seja apresentada?
Imensas, os jogos são uma ferramenta de comunicação multimédia audiovisual e como tal, algo que só use as cutscenes para esse fim está a ignorar as totais potencialidades do meio; sem contar que mesmo na cutscene propriamente dita há diversas formas de comunicação possiveis.
Costuma dizer-se que o ser humano normal pode perceptir as coisas de 5 formas: visão, audição, tacto, cheiro e paladar. Com os videojogos somos capazes de explorar 3 desses sentidos (visão por via da imagem, audição por via de som, tacto por via de rumble) de forma directa e apelar aos outros dois por via de memória (ninguém ao se encontrar numa cave atmosféricamente recriada com objectos putridos achará que cheira bem, ninguém a olhar para algo putrido achará que saberá bem; não são criados no jogo mas são recriados pela mente e pelo seu senso comum)
Todos os sentidos são capazes de transmitir uma mensagem, o som quer através do tipo de composição e sentimentos que pretende transmitir a musica cantada e a sua letra, o que aparece escrito em paredes, a forma como as texturas são e o que pretendem transmitir, objectos, dialogos simples sem ser no ambito cutscene... podiamos estar aqui até amanhã... Tudo no jogo é manipulável e tudo pode ser feito com intenções próprias... E deve.
É por isso que olhamos para jogos fotorealistas como o crysis que foram buscar uma fotografia e fizeram disso textura com tiles e para um jogo como o Okami em que todas as texturas foram feitas à mão... E o Okami é elogiado por essa componente enquanto que o crysis é um produto de ocasião, que ninguém garante se daqui a 5 anos se aguenta minimamente face a produtos tecnologicamente mais evoluidos. Isto porque um aposta no generalismo da criação da realidade, que outros tentaram antes e hoje são obsoletos e outro se focou em manipular todas as formas de ser perceptido pelo jogador.
"O que é que isto tem a ver com plot, o que é que este gajo está para aqui a dizer?" tudo. Um Okami não resultaria com gráficos realistas, um Crysis não resultaria com graficos cartoonescos; e isso inclui a história de ambos e a ideia que querem comunicar. E... comunicar é a keyword aqui... comunicar para mim já é plot, é as intenções e expressão dos criadores... algo tratado que nos chega.
Como é que isto pode ser usado? é impossivel cobrir todas as possibilidades de ser feito, mas podem ser dados exemplos notáveis. Note-se que eu peguei nestes outros pegariam noutros e não estou a tentar ser polivalente em cobrir todos os estilos possiveis e imaginários, plataformas, generos de jogos ou o que seja, e em vez disso vou pegar em exemplos do que conheço. Também vou omitir os exemplos mais obvios de storytelling, o dialogo directo e o escarrapachamento de tudo, irei abordar no entanto o que é um argumento com coisas subentendidas ou consiso. Outra variante para a qual não há tempo é a separação de FMV's num jogo em duas categorias, a categoria que serve para mostrar uma cena de acção/algo visualmente muito apelativo/recompensa e o FMV enquanto veiculo para ajudar a contar uma história. (exemplo em questão: FMV's do FF7 versus FMV's do Panzer Dragoon Saga, sendo que no FF7 eram curtos videos de "cenas" e no Panzer Dragoon eram diálogos inteiros e focados apenas nos dialogos)
Bom, aqui vai...
Exemplo 1 - Vias indirectas:
Um RPG deveras recente que ainda nem se sabe se sai do japão chamado Fragile: Farewell Ruins of the Moon, que tomando lugar num cenário desertico outrora habitado que no entanto pretende contar uma variedade de histórias cruzadas. Como fazê-lo? vestigios, a parede escrita cruza-se com o percursos e historia de quem a escreveu, o colar apanhado no chão pertencia a alguém e por aí fora, estas histórias podem ser exploradas, mas acima de tudo criaram um ambiente, saber que aquelas coisas não estão lá por acaso e têm histórias associadas que podem ser exploradas confere ao jogo uma atmosfera muito própria. Outro exemplo notável de story telling alternativo será o Deadly Creatures, um jogo de aventura (que por acaso saiu esta semana) em que o jogador controla insectos mas com uma história a decorrer no background. Dificil de explicar, mas numa história que gira à volta de cadáveres, às tantas andar debaixo da terra e ver uma mão é uma forma de comunicação directa que serve para avançar a história. Sem contar que se houvem os dialogos (audio e presença) de dois homens durante o jogo, que revelam toda a intriga a decorrer, intriga essa onde a personagem principal não intervem de forma directa. Outro exemplo de vias indirectas pode ser as incrissões em hyliano em paredes no Zelda, que até suscitam projectos de tradução para saber o que está lá escrito... E claro o Metroid Prime e o seu sistema de scanning, que acaba por chegar a contar a história de um povo extinto e o que realmente aconteceu, por exemplo.
Exemplo 2 - Personagem silenciosa versus Personagem falante:
Primeira categoria de omissão, onde a personagem supostamente não fala (emitir grunhidos não conta) excepto quando nos são dadas escolhas de respostas a nós enquanto jogador, a razão desta abordagem prende-se pelo elo jogador-personagem não ser estragado por uma voz/atitude com que não se identifica e detrairia do seu envolvimento com o jogo/noção de envolvencia, este tipo de abordagem é muito própria dos videojogos, dado que num livro não resultaria muito bem e num filme não pareceria natural a não ser que a personagem principal fosse um mimo... ou uma pessoa muda (e mesmo esses tentam comunicar de outras formas).
Apesar de muda a personagem no entanto deixa impacto nas outras como se falasse, e ao falar com pessoas, mesmo ao não ser formulada uma pergunta estas respondem, enquanto que na vida real isso nao sucederia assim (ou seja, a personagem não é realmente muda, mas é apresentada como tal a nivel de apresentação)
Em contraste existe a abordagem exactamente oposta, especialmente em jogos que pretendem ser extremamente cinemáticos (e por cinemáticos pretendo dizer, semelhantes a filmes) ao que se deixa de tentar recriar um elo com o jogador mas sim criar uma personagem extremamente memorável que o jogador gostaria de controlar (badass). Não é o unico caso em que se faz isso, mas é uma das grandes motivações porque é que num jogo de acção a personagem silenciosa não resulta.
Subcategoria - Gibberish:
Quando a linguagem falada das personagens não é uma linguagem real. (exemplos: Panzer Dragoon, Animal Crossing, Zelda TP, Banjo Kazooie, Ico, Shadow of the Colossus, Okami)
Exemplo 3 - Aparente omissão de história/dialogos/texto:
Jogos que contam a sua história preferencialmente de forma visual por via de acontecimentos de natureza gráfica, a narrativa é então totalmente convertida em acções em vez de dialogos (qualquer dialogo/linguagem falada só será usada quando não houver alternativa); podem também entrar pela questão da personagem silenciosa por forma de criar uma maior ligação do jogador ao jogo. Exemplos notáveis do género serão o Another World/Out of This World, o Ico e o Shadow of the Colossus.
Exemplo 4 - Aparente ausencia de profundidade/Ambiguidade/manutenção apenas do essencial:
Tipica de scripts antigos quando haviam limites de espaço o que significava que jogos com argumentos complexos tinham de ser concisos na sua mensagem, o que implica que todo o texto é relevante para uma finalidade e impõe a necessidade de enfiar detalhes, ao invés de adicionar conteudo superfluo para tornar o jogo mais massudo. O género continua ainda hoje, que os limites já eram como uma forma de storytelling.
Isto cria a possibilidade de duas impressões completamente diferentes, a superficial, de quem nao valoriza isso, lê as coisas na diagonal a correr ou simplesmente vê apenas aquilo que quer ver de resulta numa visão nas linhas de que o jogo tem uma história pouco complexa porque tem menos texto e o de que isso resulta em falta de profundidade... E o completo oposto, de quem realmente se interessa em ver a coisa com olhos de ver, frase a frase concluindo o que já se sabe, que afinal a história é complexa e rica em significados à base da omissão e de que a profundidade está lá, para quem a quiser.
Um perfeito exemplo deste tipo de narrativa em jogos modernos é os Dragon Quest e Zelda, sendo que o ex-libris dessa abordagem ainda deve ser o Majora Mask.
Apenas quem o jogou... irá identificar isto, mas... Lembram-se do Kafei e da Anju? Quem se lembra da Cremia? e quantos apanharam isto?
Cremia's sister, Romani reveals that Cremia is avoiding town because of her heartache at being passed over.
Romani: "Romani knows...My sister, Cremia, has someone in
town she likes...
But that person will get married the day of the carnival. It's hard
for my sister...Going into town..."
This is obviously Kafei, and Cremia confirms it on the ride to town if you tag along.
Cremia: "In town...I have a friend. Her name's Anju...Anju...The day after tomorrow is her wedding."
Leading into this previous statement, Cremia discusses her difficulties in managing the ranch by herself, implying the renewed discussion of her plight has brought back to her thoughts Kafei, who could solve them. Anju's mother would later say this to Anju in an attempt to comfort her.
Anju's mother: "Besides, think about Cremia. She needs strength from a partner and
business support from Madame Aroma (Kafei's mom). If Kafei really has run off with
Cremia, she'll get both. Please don't be sad. How happy could
you possibly be...marrying a man who runs off when he's about to be married?"
This established Cremia's possible motives, that her love for Kafei may not be completely based on him as a person, but rather what he can provide for her.
In Ocarina of Time, the "marriage proposal" from Talon to Link was predicated on the same grounds, that Link would come help at the ranch when he grew up In Majora’s Mask, Romani likes Link and after he helps her, even goes so far as to say it’s decided he will come live with them and help out. But he leaves Termina at the end. Our overall point is that like Cremia, Malon back home in Hyrule may be the third member in a triangle with Link and Zelda, but is the one with possibly less pure motives. In that, we mean she is responding to Link as the "knight in shining armor" who can save her and her future, and not necessarily him as Link, the person. In MM, Cremia will give Link an affectionate hug, but it is in it’s nature a reward for the one who played hero, and she is now after the fact recognizing and responding to that and adult within. Does it go any deeper? Given how little she knows of Link as a person, we don’t believe so. She even refers to him as "boy" early in the ride, not even knowing his name. This is much like Malon and Romani choosing not to call Link by name (which indicates who he really is), but merely remarking on his outside appearance in their nicknames.
Está tudo lá e no entanto está formulado de forma natural, está lá de forma a não ser necessáriamente entendido, como na vida real, só entendemos aquilo que queremos entender, ou nos suscita a atenção... E no entanto não é o unico, nem no Majora Mask nem na saga (tanto que o excerto que meti se acaba por extender ao próprio Ocarina of Time). E assim, um jogo com, provavelmente, 1/4 do script, em word count de um Final Fantasy moderno consegue ter personagens com 10 vezes mais profundidade... por via da adição de motivações pessoais... às vezes não inteiramente puras e respectiva evidencia delas. Perante isto as circunstancias e detalhe nem é discutivel, mas só está lá para quem o quer.
Outro exemplo notável de argumentos streamlined seriam os trabalhos de culto do Suda51 como o Silver Case e o Flower Sun and Rain, que induzem os jogadores em erro à força toda (ao ponto de a própria descrissão do jogo ser mentira); estes jogos vão mais longe o streamlined deles já passa pela descontextualização de pedaços de realidade, ao entrarem mesmo pelo campo do abstrato e pela descontextualização de palavras (uma palavra quando aplicada nos jogos dele pode ter um significado diferente daquele que lhe atribuimos). Enfim, não dá para exemplificar sem entrar em divagações, mas é de facto muito bom.
Exemplo 5 - Livre arbitrio
Duas formas de fazer isto, bifurcações no jogo que permitem tomar dois caminhos, frequentemente com consequencias/experiencias resultantes diferentes, e/ou beneficiando aquilo que seria uma acção correcta, ou a acção correcta face a uma incorrecta (muitas vezes significa que o jogo tem um código de conduta moral ou se guia por ele). Ou ainda cutscenes em que se tem de fazer alguma coisa, não me refiro a QTE's, mas refiro-me por exemplo ao Metal Gear Solid 3, naquela cutscene em que tem de ser o jogador a premir o gatilho (ou deixe passar um bocado) A ideia aí é passar a causa-efeito e peso da consequencia para o jogador.
Exemplo 6 - Feedback Sonoro/tactil:
Som como forma de guiar o jogador pelos sentidos, por exemplo, som/vibração a aumentar à medida que nos aproximamos de algo. Não tenho exemplos concretos de história associados a ele, apenas eventos, mas o potencial está lá.
Exemplo 7 -Musica:
Todos sabemos que a musica é extremamente importante para criar momentos de história, quantos de nós não associamos musicas a momentos bem conseguidos de jogos? de resto as capacidades são infinitas, incluindo a nivel de contribuir activamente para a história... porque não?
Subcategoria - Antitese musical
Variante de momentum, mas assim como o tipo que se lembrou de meter a Air de Bach numa cena de acção de Evangelion, meter musica pop-rock no Silent Hill foi igualmente brilhante e é sem duvida algo que bem podia ser utilizado mais vezes (mais do que em batalhas finais, também).
Bom, vinha fazer um post para arrebitar esta thread e escrevi um tratado >_<